“Combater o preconceito é tão importante quanto tratar a infecção”, defende Lucas Tiné, mestre em Biologia Celular e Molecular e coordenador do curso de Biomedicina da Universidade Castelo Branco
Para além das festividades de fim de ano, o mês de dezembro é reconhecido pela campanha nacional de conscientização sobre o HIV/Aids e outras infecções sexualmente transmissíveis (ISTs). Instituído em 2017, o Dezembro Vermelho chama a atenção para a prevenção, o diagnóstico precoce, o tratamento e, principalmente, para o combate ao estigma e à discriminação que ainda cerca a síndrome da imunodeficiência humana, mais de 40 anos após o registro do primeiro caso. “Apesar dos avanços na Medicina e nas políticas públicas, muitos pacientes ainda enfrentam estigmas que dificultam o acesso ao tratamento e o apoio social. O Dezembro Vermelho é uma oportunidade de educar a sociedade sobre a importância do acolhimento e da informação correta”, afirma o professor Lucas Tiné, coordenador de Biomedicina da Universidade Castelo Branco.
A fala do especialista em Biologia Celular e Molecular foi durante o Seminários Abertos realizado no último dia 12, com o tema “HIV/AIDS: O estigma e a discriminação. Superando barreiras na sociedade”. Durante a palestra, na sala Nair Muls, Tiné falou sobre a história da Aids, passando pelo registro oficial do primeiro caso, em junho de 1981, e abordando os preconceitos e estereótipos em torno desta condição. Na época, a Aids recebeu nomes como “câncer-gay”, “pneumonia dos homossexuais”, entre outros termos pejorativos reforçados pela imprensa nacional e estrangeira. O professor ressalta que os efeitos desse período são sentidos até hoje.
“A luta contra o HIV/Aids vai além da ciência, envolvendo ainda enfrentar preconceitos enraizados, que tiveram origem nos primeiros anos da epidemia, quando o HIV era associado exclusivamente à comunidade LGBTQIA+. Termos pejorativos e o sensacionalismo midiático da época fomentaram o estigma, cujos efeitos persistem até os dias atuais. Combater o preconceito é tão importante quanto tratar a infecção”, defende Lucas Tiné. O educador reforça que o vírus do HIV não escolhe nacionalidade, gênero e orientação sexual.
Avanços no tratamento da Aids
Não foi só nas Olímpiadas que o Brasil quebrou recordes recentemente: um boletim epidemiológico lançado pelo Ministério da Saúde registrou a menor taxa de mortalidade por Aids da série histórica em 2023. Em comparação com a última década, a redução foi de 32,9% no coeficiente padronizado de mortalidade, que passou de 5,7, em 2013, para 3,9 óbitos por 100 mil habitantes no ano passado. Os dados também revelam um crescimento de 4,5% de casos de HIV em relação a 2022, atribuído ao aumento da capacidade de diagnóstico do serviço de saúde do país.
Durante a palestra, Lucas Tiné também falou sobre as metas globais definidas pela Organização das Nações Unidas (ONU) para 2030, a conhecida 95-95-95: diagnosticar 95% das pessoas vivendo com HIV; 95% delas em tratamento antirretroviral; e 95% das pessoas em tratamento com supressão viral, ou seja, não transmitindo o vírus. No ano passado, 96% da população vivendo com HIV e que não sabia da condição recebeu o diagnóstico. Agora, o território brasileiro tem como números gerais, respectivamente, 96%, 82% e 95% de alcance — restando apenas a meta da supressão viral a ser superada.
Para alcançar o objetivo, existem diversas formas de tratamento do HIV, como a terapia antirretroviral altamente ativa, popularmente conhecida como “coquetel” ou HAART, destacada pelo professor, que combina múltiplos medicamentos para maximizar a eficácia no combate ao HIV. A abordagem se propõe a reduzir a carga viral a níveis indetectáveis, permitindo que as pessoas vivendo com o vírus levem uma vida saudável, além de minimizar os riscos de transmissão.
O educador também chama a atenção para os métodos preventivos, como o uso de preservativos durante as relações sexuais, o não compartilhamento de agulhas e seringas, o uso de luvas para a manipulação de feridas, entre outros cuidados. No caso de exposição ao vírus, o professor reforça a importância dos insumos de prevenção como a Profilaxia Pré-Exposição (PrEP), medicamento disponibilizado gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e que, quando usado de forma adequada, reduz significativamente o risco de infecção pelo HIV. Para acessar o preventivo, é necessário fazer o teste do vírus, o que está diretamente relacionado ao aumento do registro de casos de HIV no Brasil. De 2022 para 2023, o número de usuários desse método passou de 50,7 mil para 109 mil — representando um aumento de 115%.
“O apoio da sociedade civil e das instituições de saúde é fundamental para desmistificar o HIV e incentivar as pessoas a se testarem regularmente. Diagnosticar precocemente o HIV é essencial, pois quanto mais cedo o tratamento é iniciado, melhores são os resultados para a saúde e menores são as chances de transmissão”, afirma Lucas Tiné.