Yedda Ching San Filizzola, da 2ª Vara Criminal de Bangu, também abordou o caráter mediador da área, passando pela relevância de se evitar a polarização no âmbito jurídico
No terceiro dia da Semana do Direito da Universidade Castelo Branco, alunos de diversos períodos participaram de uma palestra ministrada pela juíza da 2ª Vara Criminal Regional de Bangu, Yedda Ching San Filizzola, que abordou o tema da violência doméstica e as diretrizes da Lei Federal 11.340/2006, a Lei Maria da Penha. A legislação cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra mulheres, caracterizada por violações que causam danos físicos ou emocionais à vítima. Mais cedo, estudantes do Núcleo de Práticas Jurídicas (NPJ) participaram de um estudo de caso concreto sobre o assunto, colocando em prática os ensinamentos vistos em sala de aula.
Em sua fala, a magistrada pontuou que a violência doméstica pode acontecer de diversas maneiras e não está restrita somente às mulheres, podendo ocorrer com qualquer pessoa. “Estatisticamente, a violência contra a mulher é mais frequente devido a desigualdades sociais e à força física masculina. No entanto, pode ocorrer com qualquer pessoa, independentemente de gênero, que deve registrar ocorrência e buscar proteção jurídica”, explicou.
Filizzola destacou ainda as diferentes manifestações da violência doméstica: física, emocional, moral, patrimonial e psicológica. “Por exemplo, impedir o acesso ao dinheiro, insultar, humilhar, ou até mesmo ironizar constantemente são formas de violência. Já a violência psicológica ocorre quando a mulher é desvalorizada, como em frases que desmotivam seus esforços, por exemplo: ‘você não vai conseguir emprego, mesmo estudando’. Todas essas práticas são previstas por lei, que busca criar uma sociedade sem esses comportamentos”.
De acordo com a juíza, a Lei Maria da Penha trouxe uma perspectiva mais humanizada no tratamento às vítimas de violência doméstica, com o Estado passando a buscar olhar e entender o que a vítima precisa e como é possível ajudar de alguma maneira. “A lei assegura direitos como a medida protetiva de urgência, assistência jurídica no processo, pedido de mudança de local de trabalho no caso de empresas de grande porte, entre outros. Ela quer ver e ouvir a vítima”, afirmou.
A palestrante também chamou a atenção para o caráter mediador do Direito e a importância de evitar a polarização. Para Filizzola, os profissionais da área devem se atentar para não usarem a Lei 11.340 como uma forma de fomentar uma “guerra dos sexos”, evitando que o sistema judicial se torne um campo de batalha. “Precisamos lutar pelos direitos, mas entender que o Direito não vai mudar o mundo. A violência doméstica não deve ser encarada com vaidade profissional; não devemos nos orgulhar de ter colocado o agressor na prisão ou de ter absolvido alguém. Muitas vezes, é melhor mediar a situação. A calibragem do atendimento é crucial para entender a lei e as necessidades das pessoas envolvidas, pois existem crianças e idosos dependentes em muitas dessas famílias”.
O que fazer em caso de violência doméstica
Durante a sua participação na Semana do Direito, a magistrada falou ainda sobre como a vítima pode agir diante de uma situação de violência doméstica, buscando seus direitos legais. “O primeiro passo é ir à uma delegacia para registrar a ocorrência. Esse registro é fundamental não apenas para dar andamento ao processo, mas também para termos dados estatísticos sobre esses casos. Na delegacia, a vítima pode solicitar todas as medidas necessárias, como medidas protetivas ou a instauração de inquérito”, sublinhou.
Além disso, Filizzola ressaltou que o combate à violência é um pacto social de toda a comunidade, com a denúncia de um caso podendo partir inclusive da testemunha, sendo uma inovação da Lei Maria da Penha. “Se alguém percebe uma situação de violência, pode registrar uma ocorrência ou solicitar medidas protetivas, como afastamento do agressor ou proibição de contato. Para isso, é possível recorrer à Defensoria Pública ou a um advogado”, disse a juíza. “É fundamental reconhecer que a violência doméstica é uma realidade que precisa ser superada. Não podemos viver em conflito, seja em casa ou nas ruas. Embora não seja o único problema grave no Brasil, a violência no lar prejudica o ambiente familiar, que deveria ser um local de paz. Essa situação impacta negativamente as crianças, e precisamos abordar a violência doméstica considerando essas consequências. A colaboração entre as áreas de direito, saúde e psicologia é essencial para estabelecer uma sociedade mais saudável”.